Marcos Hashimoto - Abismo separa empreendedores do mundo acadêmico

Abismo separa empreendedores do mundo acadêmico

Desde que comecei a me dedicar ao estudo do empreendedorismo tenho me surpreendido com a quantidade de conhecimento já gerado por universidades do mundo inteiro e tenho me refestelado com todo este aprendizado. Da mesma forma, tenho me surpreendido com a amplitude das áreas de estudo em empreendedorismo: start-ups, Empreendedorismo social, empreendedorismo corporativo, educação empreendedora, inovação, sobrevivência e mortalidade, empresas familiares, empreendedorismo feminino, empreendedorismo étnico, empreendedorismo internacional, franquias, jovens empreendedores, pequenas e médias empresas, empreendedorismo na economia, fontes de investimento, empreendedorismo no setor público, empreendedorismo rural e regional, perfil empreendedor, empreendedorismo na terceira idade, entre vários outros.

Mesmo assim, circula no meio acadêmico uma certa crença de que o tema ainda é muito novo, existe pouca unanimidade sobre o assunto e trabalhos de pesquisa nesta área não recebem os devidos créditos por parte da comunidade científica. Provavelmente o caráter multidisciplinar do tema e a visibilidade popular que o assunto ganhou nos últimos anos contribuíram para esta aura de ‘patinho feio’ entre os pesquisadores.

O curioso é que, do outro lado, dos empreendedores, o meio acadêmico tampouco desperta algum interesse real. Muitos empreendedores acabaram interrompendo os estudos para perseguir seu sonho do empreendimento próprio. Outros tentaram manter a fé na educação ou tentaram voltar ao banco da escola depois de estabilizar seus negócios, com a esperança de agregar valor ao seu negócio através do aprendizado acadêmico. Não raro, a frustração envolvia estes esperançosos ao se deparar com a distância entre o conhecimento teórico e sua realidade do dia-a-dia.

Afinal de contas, qual a importância de conhecer o US GAAP se ele mal consegue entender o que seu contador diz? Para que serve o Balanced Scorecard se ele não tem sequer as métricas básicas para conhecer seu negócio? De que adianta calcular o duration de aplicações em derivativos se nem conhece opções de investimentos? Como pensar em marketing experiencial se nem sabe monitorar a satisfação dos clientes?

O que vemos, em resumo, são empreendedores se afastando cada vez mais de cursos e escolas de negócios porque os conteúdos não trazem respostas práticas aos desafios diários ao mesmo tempo em que acadêmicos se afastam cada vez mais dos empreendedores por acharem que estas questões são mundanas demais, simples demais, corriqueiras demais, para eles estudarem com a profundidade que querem.

Não são todos que enxergam o enorme abismo entre estes dois mundos, assim como são menos ainda aqueles que se dispõem a diminuir esta distância. Aqueles que se aventuram a perseguir este caminho acabam caindo no ostracismo do esquecimento e da rejeição dos dois públicos. O grande desafio das escolas de administração que se dizem aptos a formar empreendedores, está, antes de tudo, em reformular suas grades para trazer conteúdos específicos e práticos, em segundo lugar, trazer acadêmicos que falem e queiram falar a língua do pequeno empresário e em terceiro lugar, entender que o aprendizado para este público não acontece só em sala de aula.

Uma experiência bem sucedida foi realizada pelo Ibmec São Paulo no início deste mês. Em um evento voltado apenas para empresários, a entidade trouxe um palestrante que, de forma bastante informal, trouxe para debate as principais dificuldades e limitações enfrentadas pelo empreendedor na gestão financeira de seu negócio. A parte inovadora da proposta do encontro, entretanto, coube à segunda parte do encontro, em que os participantes foram divididos em grupos de discussão sobre sub-temas de finanças previamente estabelecidos. Nestes painéis, não havia um acadêmico ou palestrante, mas apenas um mediador, sem conhecimento técnico nenhum, que coordenava as participações dos empresários, estas sim, altamente instrutivas e enriquecedoras.

A iniciativa mostrou que o empreendedor, solitário na maioria das vezes, em suas decisões estratégicas, não só aprende muito com outros empreendedores, até de áreas de atuação diferentes, como também descobre o valor de seu próprio aprendizado prático para seus colegas. O painel funciona, assim, como um grande fórum de discussões em que se estimula a troca de conhecimentos e experiências práticas, cuja riqueza de variedade e aplicabilidade especifica, supera, em muito, o aprendizado unilateral provido por especialistas, consultores ou professores.

Iniciativas de sucesso em educação para empreendedores só acontecerão entre as escolas que aplicarem esta receita. Vamos acompanhar de perto para ver quem vai agir de forma empreendedora, aprender a mudar seus conceitos, quebrar seus paradigmas e trazer uma nova proposta que esteja alinhada com o jeito pragmático e extremamente objetivo do empreendedor.

* Marcos Hashimoto é Doutorando em Administração pela EAESP/FGV, sócio-diretor da Lebre Consulting, Coordenador do Centro de Empreendedorismo do Ibmec São Paulo, foi executivo no Citibank e na Cargill Agrícola. É um dos autores do software de Plano de Negócios SP Plan da parceria Sebrae-SP/Fiesp, parceiro do Instituto Chiavenato e Instituto Empreender Endeavor e é autor do livro 'Espírito Empreendedor nas Organizações' pela Editora Saraiva..

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

V EGEPE – Encontro de Estudos sobre Empreendedorismo e Gestão de Pequenas Empresas

Heutagogia

Louis Jacques Filion